terça-feira, abril 16, 2013

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(Imagem: Google)

Hoje saímos a três...

Hoje saímos a três. Eu, minha amante solidão e a melancolia. Adentramos um dia cheio de realidades fictícias. As casas e os prédios pareciam tão altos quanto havia de sonho em nós. Alguns carros com seus motores pensantes em rodar conduziam mais dos apressados para algum lugar que não nos cabia saber, embora o pensar criasse várias situações. Íamos com o vento fresco, quase frio em suas propriedades epidérmicas de invisibilidade. O que víamos agarrava-se ao sentir. Eu sentia cócegas de sorrisos e envolvia-me em gargalhadas de insetos sobreviventes do anterior anoitecer. Não éramos um apanhado de coisas táteis ou corpos embevecidos nos copos que os bares reluziam convidativas confusões. Fechamos a cortina do óbvio. É tão simples doer pelo irreal que não nos é impossível acreditar tudo uma imensa e supérflua realidade.
Afastamo-nos até onde os interiores misturavam-se e víamos mais do que as aparências forçadas da mente em cultivar um intelecto errôneo. O outro em sua programação domingueira escorria pelos outros dias a repetição de uma sentença, quando não nos era esperado algo fora de nós. A solidão esforçou-se em uma sacudida e estávamos outra vez sozinhas, repletas de nós, de tudo o que nos cabe nesse pedaço de construção. De certa forma transpúnhamos o comum. Vagávamos a passos necessários o pódio dos deuses recriados conforme a necessidade de invenção. Entenda, a invenção é só uma forma de nos prepararmos para o que determinados alcançaremos.
Temporariamente havia tempestades. Carbonos imprimidos no desafio de navegarmos até a clareira dos olhos d’alma. Um sombreado de ser triste para entender o quão se pode ser feliz. Não usávamos capas de chuva, proteção alguma contra o natural a efetivar-nos no galopante tempo de colheita. E a vida passava assim, tão despercebida, tão concentrada. Tão menina nos ossos velhos de quem percorria as fogueiras que cada um possui porque nós as criávamos ali. E colhíamos amor, não do outro. E colhíamos felicidade, não através do outro. Tudo na bagagem a ser aberta no segredo das confissões sem terceiros.
Um agoureiro pássaro piava um defeito, uma lacuna a ser preenchida com o desprendimento. Quanto mais vazias mais cheias estávamos de tudo o que nos era compreendido transbordar. A biblioteca do silêncio incitava-nos ao mergulho. Primeiro abríamos com as mãos limpas o lamaçal do limbo de nossos medos e ríamos atoladas em nossas ilusões a pureza de escorregar umas três lágrimas límpidas em contraste a cena. Nada era tão terrível quanto o molde que nos impuseram para crermos em contos de fadas. Nada era mais assustador do que descobrirmo-nos causadores do que não existia. O barqueiro em sua posição esfregava as mãos para que nos afogássemos ou para que implorássemos a sua ajuda. Em revolta nós três debatíamos. Recusávamos mais de fora. Era-nos vigente a glória solitária. Um encontro íntimo do eu com suas funções. Nadávamos os monstros, as serpentes e os lobos raivosos dos livros de infância, dos catecismos e até dos gibis. Da sua barca o barqueiro parecia interrogar-se enquanto o sol resplandecia e sua imagem difundia-se na imensidão do ser. Nada além do belo permanecia e esse belo éramos nós em descoberta.
Revigoradas estávamos do outro lado de nós mesmas. Do lado que queríamos estar. Sem esperarmos aplausos, sem ouvi-los se existiram. Eu, a solidão e a melancolia, damas itinerantes de outros sentimentos vestidos de sensações que ousassem perturbar-nos nos encontros a que nos entregávamos para a completitude una.
Nenhum homem é verdadeiramente homem quando não aprende a cultivar suas vicissitudes.

Eliane Alcântara.

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